O relógio marcava meia noite. Início de um novo dia, ou apenas começo de uma longa noite? O silêncio da cidade denunciava a paz que parecia inundar as ruas. Seus pensamentos, em contrapartida, soavam como uma música confusa, sem tom, sem ritmo, sem harmonia. "Harmonia?", ele se perguntava. Nunca houve harmonia. Fora enganado tantas vezes pelas mil sinapses que o levavam às suas memórias. Viajar ao passado era símbolo de uma nova ressignificação. Num dia, vinham carregadas de felicidade; no outro, ódio, raiva. Revivê-las mentalmente nunca as modificaria, mas ele buscava a forma correta de vê-las, buscava paz para poder alcançá-las sem tanta inconsistência, fragilidade. A memória humana é traiçoeira, contudo. Ele não sabia. Um tanto inexperiente da psicobiologia. Não importa quão inflexível sejamos, uma viagem ao límbico traz episódios para serem revividos, e isso significa recodificá-los. Novos sentidos são absorvidos. Novas sinapses são planejadas. Uma nova memória. Boa? Ruim? Quem sabe. Seu defeito é pensar demais. Pensa tanto que, sem perceber, já está la revirando as mesmas memórias. Again, and again... Mais uma longa noite, mais uma música desconexa para agitar a madrugada calada.
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